quarta-feira, 16 de dezembro de 2009


De aorcdo com uma pqsieusa de uma uinrvesriddae ignlsea, não ipomtra em qaul odrem as lrteas de uma plravaa etãso, a úncia csioa iprotmatne é que a piremria e útmlia lrteas etejasm no lgaur crteo. O rseto pdoe ser uma ttaol bçguana que vcoê cnocseguee anida ler sem pobrlmea. Itso é poqrue nós não lmeos cdaa ltrea szoinha, mas a plravaa cmoo um tdoo.

domingo, 13 de dezembro de 2009



Um blog sine qua non!

sábado, 12 de dezembro de 2009

Entre a Cruz e a Poesia

A antífona de entrada da liturgia que, hoje, celebra a memória do maior santo e poeta do Siglo de Oro espanhol, é tirada da epístola de São Paulo aos Gálatas, e diz: "A cruz de nosso Senhor Jesus Cristo deve ser a nossa glória: Nele está nossa vida e ressurreição, foi Ele quem nos libertou (Gl. 6:14)". Juan de Yepes Álvarez, também conhecido como San Juan de la Cruz, foi um dos grandes mestres e testemunhas da experiência mística, mas, antes disso, foi um homem apaixonado e apaixonante. Sua aparente austeridade não pode ocultar este fato, que se revela em todas as luzes no lirismo de seus poemas, na radicalidade de suas escolhas e na concentração de seu viver vocacionado. Filho de uma rica família de Toledo, ele contrariou os pais quando, aos 17 anos, casou-se com uma belíssima garota pobre, para quem escreveu seus primeiros poemas. Tendo sido deserdado, Juan manteve-se firme na decisão e tornou-se tecelão de seda para prover o sustento da linda esposa, que todavia morreria após um ano de intenso convívio conjugal. Sobrevindo a viuvez, ele foi estudar teologia em Salamanca, depois mudou-se para Ávila, onde se tornou monge. Foi lá que, em 1577, aos 25 anos, ele se encontrou pela primeira vez com a misteriosa Teresa d'Ávila, renomada poetisa e monja, que o iniciou na contemplação mística de Deus, e fez dele o seu confidente e principal interlocutor espiritual. Juntos, Juan e Teresa produziram a melhor poesia sagrada da língua espanhola, e iniciaram o movimento de crítica e reforma da vida religiosa que lhes custaria difamações, perseguições e os maus tratos da Inquisição. O santo poeta definiu este episódio conturbado e cheio de incertezas de sua trajetória, como "A Noite Escura do Espírito" - título de seu poema mais conhecido. Profundamente marcado pelo sofrimento, ele decidiu assumir o cognome de Juan de la Cruz, e desde então, como um redivivo, passou a compor os versos de quem prova a paixão de Deus e a paixão do homem. A noite escura do espírito, segundo Juan, é metáfora para o mistério da Fé e da Esperança que só podem se consumar na Caridade, que é a realidade última de Deus - e na presença plena de quem, esta mesma fé e esta mesma esperança tornam-se supérfluas, bastando a caridade. Em sua poesia, Juan de la Cruz compara a fé e a esperança a duas lâmpadas preciosas que nos conduzem pela escuridão da existência terrena, e nosso espírito a uma taça vazia, cuja boca se abre para que a Graça da caridade o habite. Como herdeiro lírico do "Cântico dos Cânticos", ele descreve as carências do espírito humano em termos de um erotismo sublime, e como continuador de São Paulo ele faz da Cruz de Cristo a metonímia definitiva da paixão verdadeira. Ouçamo-lo:

Eu dormia, mas o meu coração velava
E ouvi o meu amado que batia:
Abre minha amada, minha irmã,
Pomba sem defeito!
Tenho a cabeça orvalhada,
Meus cabelos gotejam sereno!
Já despi a túnica,
E vou vesti-la de novo?

Como se pode vê, é a lírica do "Cântico dos Cânticos" que assinala o modo como Juan de la Cruz compreende e expressa o cerne da nossa existência: o desejo! E sendo o desejo a contingência universal da natureza humana, só a sua objetivação em Deus pode plenificá-lo e abri-lo inteiramente à transcendência, cujo emblema é a cruz. Cristo, diz o santo-poeta, não pregou a aniquilação do desejo ou da paixão, pois era "verdadeiro Deus" e "verdadeiro Homem". Não quis desumanizar-nos, embotando nosso coração ou nos fazendo fugir dos sentimentos como fazem os estóicos e niilistas. Antes, ensinou-nos a vivê-los consciensiosamente, em máxima caridade, a ponto de aniquilarmos a nós mesmos!... Quem quiser segui-Lo, que tope o desafio: tome sua cruz e siga-O. Juan tomou a sua cruz e fez dela a mais bela poesia sobre os mistérios de Deus na alma e da alma em Deus. Sua imensa obra poética foi lida ao longo destes últimos quatro séculos, em várias línguas e lugares. Muitos dos seus leitores, naturalmente, não o entenderam, porém, isso não o impediu de marcar, indelevelmente, a moderna literatura ocidental com uma experiência espiritual que ecoou, e ainda ecoa, na noite escura da atualíssima insensibilidade estética, para não dizer espiritual.
Com efeito, o Deus dos filósofos iluministas e dos laicistas radicais pode ter morrido no século XIX, mas o Deus de San Juan de la Cruz, e a linguagem e a visão de mundo gerada por sua "presença real" continuam formidavelmente vivos e operantes nos escritos de Cervantes, Pascal, Thomas Hardy, Hölderlin, Dostoiévski, Proust, Joyce e Borges. Nós não teríamos os ritmos inquietantes da prosa de Mauriac e Grahan Green, nem as aflitas indagações de Baudelaire, Thomas Mann ou Faulkner. Não teríamos o erotismo sagrado de John Donne, Hilda Hilst e Adélia Prado. Nem o mundo de Schoenberg e Guimarães Rosa, que é bíblico até o âmago. Não teríamos sequer a peça “Fim de Jogo” de Beckett, que é uma meditação precisa sobre os instrumentos e as finalidades da Paixão. Se temos isso, e muito mais, é porque estes escritores optaram por continuar uma mística poética à qual, confessadamente, foram expostos por San Juan de la Cruz.

Cristo de San Juan de la Cruz, segundo Salvador Dali

Quando era adolescente, o gênio da pintura surrealista, Salvador Dali foi ao Mosteiro da Encarnação, em Ávila, visitar o túmulo de São João da Cruz, seu "poeta de devoção", como ele mesmo dizia. Na ocasião, ao conhecer a antiga cela do místico, Dali viu um pequeno desenho da crucificação de Jesus Cristo, feito de uma perspectiva totalmente inusitada, e que na sua opinião só poderia ser "consecuencia de un estado de éxtasis!..."




Em 1951, já adulto e famoso, Dali fez sua própria versão da imagem, e pintou um Cristo de cabelos curtos, sem coroa de espinhos, sem sangrametos e, no lugar da famosa inscrição no topo da cruz, ele colocou uma folha de papel dobrada: um poema de São João da Cruz!... Abaixo, pintou a baía de Port Lligat, onde vivia. Ao expor a imagem, Dali declarou que sua "ambición estética en ese cuadro era la contraria a la de todos los Cristos pintados por la mayoría de los pintores modernos, que lo interpretaron en el sentido expresionista y contorsionista, provocando la emoción por medio de la fealdad. Mi principal preocupación era pintar a un Cristo bello como el mismo Dios que él encarna."

A noite escura da alma




Que bem sei eu a fonte que mana e corre,
mesmo sendo noite!

Aquela eterna fonte está escondida,
que bem sei eu aonde tem guarida,
mesmo de noite!

E pela noite escura desta vida,
que bem sei eu por fé a fonte frida,
mesmo de noite!

Sua origem não sei, pois não a tem;
mas sei que toda origem dela vem,
mesmo de noite.

Sei que não pode haver coisa tão bela,
e sei que céus e terra bebem dela,
mesmo de noite.

Bem sei que solo nela não se vê
e ninguém pode atravessá-la a pé,
mesmo de noite.

Tem claridade nunca escurecida,
e sei que toda luz é dela havida,
mesmo de noite.

Sei serem tais caudais suas correntes
que céus e infernos regam, como às gentes,
mesmo de noite.

A caudal que provém desta nascente
bem sei ser mui capaz e onipotente,
mesmo de noite.

A corrente que de uma e outra procede
sei que nenhuma delas a precede,
mesmo de noite.

Bem sei que três numa única água viva
residem, e que de uma a outra deriva,
mesmo de noite.

Aquesta eterna fonte está escondida
em nosso vivo pão, por dar-nos vida,
mesmo de noite.

Aqui estão chamando as criaturas,
e fartam-se desta água, ainda às escuras,
porque é de noite.

Aquesta esta viva fonte, que desejo,
eu neste pão de vida bem a vejo,
mesmo de noite.




San Juan de la Cruz

A arte de detonar vírgulas.

sexta-feira, 27 de novembro de 2009

La Lispector

Dizem que um shtetl ucraniano era algo pior do que um gueto, pois se nos guetos havia saneamento, nos shtetl - desculpem a expressão - as pessoas cagavam na rua. E foi num destes shtetl que Clarice Lispector nasceu no ano de 1920, tendo porém a sorte de sobreviver e escapar da medonha realidade dos progroms soviéticos, onde - segundo os dados da Cruz Vermelha - as pessoas se alimentavam dos “defuntos excedentes”. Este prelúdio é bastante contrastante com a imagem que temos da escritora chiquérrima e introvertida que, não obstante, foi o nome feminino mais brilhante e influente da literatura brasileira do século XX. Os traços biográficos mais remotos que entrevemos na obra de Clarice nos conduzem a uma infância de felicidade clandestina nas ruas do bairro judeu de Recife: onde ela se vestia de papel crepom para brincar nos blocos de carnaval, apaixonava-se pelos cachorros vadios, escrevia estórias para o caderno infantil do Diário de Pernambuco (quase sempre rejeitadas), e deixava-se hipnotizar pelo violino de um velhinho expatriado e melancólico como ela. Tudo isso tem o nostálgico sabor dos contos de Isaac Bashevis Singer, todavia a vida de Clarice Lispector, bem como sua narrativa, são quase kafkianas. Quando tinha apenas 17 anos de idade, mas já uma moça linda, profunda, estranha e perigosa, Clarice escreveu seu primeiro romance, “Perto do coração selvagem”, que sacudiu todo o mainstream literário nacional dos anos 40. Desde então a grife Lispector começou a se expandir, compondo uma lenda em que se confundiam Marlene Dietrich e Virginia Woolf, ou segundo a definição do crítico americano Benjamin Moser: “um Kafka com propensões a tailleurs Chanel!...” Que fosse estilosa não resta dúvida, mesmo as fotos da velhice (precipitada pelo câncer) revelam isso. Mas, a bem da verdade, o charme emanava mesmo era da escrita. Embora não seja unanimidade, Clarice Lispector em algum momento acaba nos deslumbrando, quer seja pelo inusitado dos enredos, dos personagens ou mesmo só da narrativa... e que narrativa. Quando publicou seu segundo romance logo notaram que se tratava de um caso único e inimitável: um texto intrigante, com algo de sonho, de fantástico e, não raro, de absurdo, de alucinação, de pesadelo. E o elemento fundante deste texto era um inesgotável veio poético. Ávida de sensações e impressões, o empenho constante de Clarice era captar as mais extremas experiências pessoais e depois expressá-las numa linguagem também estritamente pessoal, de súbitos milagres verbais. Tal processo invariavelmente resultava numa policromia difusa que lembrava o pontilhismo da pintura de Van Gogh - com sua perspectiva imprecisa, as cores fortes e contrastantes de uma realidade desconcertante. O perigo imediato de tudo isso, bem sabemos, é a gratuidade artística. Com efeito, Clarice só alcança a plenitude em narrativas curtas: contos, crônicas, cartas e pequenas novelas. Na amplidão dos romances a estrutura pouco definida de suas narrativas tende a evanescer. Há na autora uma irresistível tendência para a fuga ao enredo. A fluidez, a nebulosidade, a dispersão conspiram contra a elaboração discursiva longa - exceto as de Proust. Clarice não analisa, não narra, apenas poetiza. Fascina-a o “como”, e não o “por que”, nem o “para que”. Em consequência, seus romances são confusos, ora tediosos ora difíceis de acompanhar. Lemos suas páginas não como partes de um mesmo corpo estético, mas como poemas desgarrados. Esplêndidos flagrantes poéticos, por certo, porém intermitentes, desconexos, soltos. Contudo, não sejamos implicantes, a ousadia tem seu preço e ninguém jamais ousou escrever como ela. Nas mãos de Clarice os substantivos são adjetivados, enquanto os verbos e advérbios são substantivados. E os adjetivos foram tão inusitadamente manejados que - na língua portuguesa - não se via um fenômeno semelhante desde Eça de Queirós. Um fenômeno, aliás, que resiste incólume às traduções, pois não é a toa que sua vasta legião de admiradores, cada vez mais se crescente mundo a fora, manifesta um olhar de fascinação quase demente quando comentam seu estilo. Orhan Pamuk, por exemplo, confessou recentemente que sofre de uma séria dependência estética lispectoriana (e isso em turco!); já o badalado Colm Tóibín, um sequaz obstinado, nunca perde a oportunidade de mencioná-la, seja em artigos, em entrevistas, ou mesmo no twitter. Até a best-seller furreca Meg Cabot declarou ter em Clarice um paradigma, uma meta (ainda a ser alcançada, claro!), e seu livro preferido é a coletânea de contos “Laços de Família”. Ah! Guillermo Arriaga, o mais notório romancista mexicano, disse que não é possível ler Clarice Lispector, sem cair de amor por ela. E, last but not least, o literato americano Benjamin Moser, já citado, crítico e expert em literatura judaica do século XX, tem se dedicado a descobrir que segredos tem Clarice, e, por tabela, entronizá-la no moderno cânon judaico. Que assim seja. Ela merece, porque, em literatura, a linha delicada entre destreza e genialidade não é outra senão a linha que demarca o recurso a uma linguagem comum e a produção de uma linguagem própria, que, a princípio estranha e idiossincrática, acaba por tornar palpável a marca invisível das nossas experiências. E foi isso que Clarice fez. Mesmo nos textos mais difíceis, podemos e devemos apreciar a sua arte com o fascínio intrigado de quem contempla a insondável palpitação dos céus noturnos... à hora das estrelas.

STRIKE A POSE

Uma vez Clarice Lispector disse que detestava ser fotografada, mas não é o que parece... Entes livros, jóias, taillers, e muitas caras e bocas, ela foi provavelmente a escritora mais fotografada (e fotogênica) do Brasil. Quase uma top-model da literatura:






Para saber mais...


O escritor e crítico norte-americano Benjamim Moser, conta toda a trajetória de Clarice Lispector, desde a origem miserável e violenta na Ucrânia - onde ele passou um ano escavando vestígios - até o póstumo reconhecimento internacional.

sexta-feira, 20 de novembro de 2009

Entre densas nuvéns de incertza, o relampejar da esperança...


"Alivia a minha alma, faze com que eu sinta que Tua mão está dada à minha, faze com que eu sinta que a morte não existe porque na verdade já estamos na eternidade. Faze com que eu sinta que amar é não morrer, que a entrega de si mesmo não significa a morte. Faze com que eu sinta uma alegria modesta e diária. Faze com que eu não Te indague demais, porque a resposta seria tão misteriosa quanto a pergunta. Faze com que me lembre de que também não há explicação porque um filho quer o beijo de sua mãe, e no entanto ele quer, e no entanto o beijo é perfeito. Faze com que eu receba o mundo sem receio, pois para mim esse mundo é incompreensível, e eu fui criada também incompreensível, então é que há uma conexão entre esse mistério do mundo e o nosso, mas essa conexão não é clara para nós enquanto quisermos entendê-la. Abençoa-me para eu viva com alegria o pão que eu como, o sono que durmo, faze com que eu tenha caridade por mim mesma, pois senão não poderei sentir que Deus me amou. Faze com que eu perca o pudor de desejar que na hora de minha morte haja uma mão humana amada para apertar a minha, amém."


Prece,


Clarice Lispector.

Beth Goulart vive Clarice Lispector


Eu não vi, nem sei se verei (moro na beirada do mundo!), mas a crítica eXpecializada disse que "Simplesmente eu, Clarice Lispector", estrelado, produzido e dirigido por Beth Goulart, é, certamente, um dos melhores espetáculos teatrais do ano. Adoraria conferir.

No momento: lá pelas bandas dos pampas gaúchos.

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Eu acho que vi leitores!... Vi sim!!!


Oi, tudo bem com vocês?
Pois é sumi por um tempo, eu sei, mas vocês acreditam se eu disser que foi por pura necessidade? O mundo me atropelou nos últimos meses, mas um atropelo daqueles a La Macabea no fim de "A Hora da Estrela", de Clarice Lipsector, sacumé? A vida me manteve ocupado por demais, demais até pra vir aqui.
No final do processo eu pensei em desistir dessa biblioteca: livros demais para meus pobres ossos!... Pensei mesmo. Que sentido manter um blog que você não consegue atualizar? Aliás, o que é um blog senão um monte de atualizações? No meu caso, isso aqui tem uma atualização cada dia, ou melhor, cada bimestre mais precária.
Daí eu cogitei parar. Foi então que lembrei que isso aqui tem já 2 anos, que isso aqui já trouxe pra minha vida um bocado de gente boa, legal, inteligente, que esse blog me ensinou um monte de coisas, que falei de um monte de escritores que merecem uma releitura, uma redescoberta, e são tantos. Como desistir dele?
Não deu :)

Continuo por aqui. Muito menos frequente do que gostaria e do que já fui um dia, but... faz tempo que descobri que não se pode ter tudo. Rá! :P

terça-feira, 10 de novembro de 2009

Leitura aeróbica


Ouve a última: Em uma hora de leitura, o corpo queima 70 calorias. Se você estiver lendo sobre qualidade de vida, queima o dobro. Qual a lógica disso? Alguém pode me explicar onde entra a ciência nessa história? Por via das dúvidas, biblioteca aqui vou eu.

domingo, 11 de outubro de 2009

pAlaVraS caNtaDas


Saiba,
Todo mundo foi neném
Einstein, Freud e Platão também
Hitler, Bush e Sadam Hussein
Quem tem grana e quem não tem
Saiba:
Todo mundo teve infância
Maomé já foi criança
Arquimedes, Buda, Galileu
e também você e eu
Saiba,
Todo mundo teve medo
Mesmo que seja segredo
Nietzsche e Simone de Beauvoir
Fernandinho Beira-Mar
Saiba,
Todo mundo vai morrer
Presidente, general ou rei
Anglo-saxão ou muçulmano
Todo e qualquer ser humano
Saiba,
Todo mundo teve pai
Quem já foi e quem ainda vai
Lao Tsé, Moisés, Ramsés, Pelé
Ghandi, Mike Tyson, Salomé
Saiba,
Todo mundo teve mãe
Índios, africanos e alemães
Nero, Che Guevara, Pinochet
e também eu e você.
fEliZ dIa DaS cRiAnÇas

sexta-feira, 2 de outubro de 2009

Só um instantinho, já volto!...


Solilóquios...


Uma vez a Adélia Prado disse que as coisas que aconteciam com ela só se tornavam reais depois que ela passava para o papel!... Comigo (às vezes) também é assim.

quarta-feira, 29 de julho de 2009

Épico Brasilensis

Retrato de Euclides da Cunha - Cândido Portinari.

É impossível não admirar Euclides da Cunha. Seja pela sensação de fascínio, seja pelo assombro ou pela impressão de absurdidade, a admiração sempre sobrevém. É um pensador profundo, um artista de primeira ordem, um intelectual honesto, mas, sobretudo, um profeta. Grandes escritores são inopinadamente profetas, porque, a despeito do tempo e do lugar, realizam sua obra em dissonância com as perspectivas e expectativas vigentes, mas em consonância com o atemporal. Foi o que Euclides da Cunha fez em “Os Sertões”. Com um mérito muito maior do que qualquer outra saga depois de “Os Lusíadas”, a narrativa de “Os Sertões” incorpora o ressurgimento do épico na língua portuguesa, e de uma forma insólita. Trata-se de um poema geopolítico, histórico, jornalístico, sociológico, enciclopédico – enfim, é inapreensível a vastidão dos seus aspectos. E este caráter de magnitude é essencial sob duas proposições: primeiro, como sugestão, óbvia, do estilo épico e, depois, como meio de comunicar um sentido de História. Com alguma reflexão torna-se evidente que a imensidão é a liberdade mínima para o gênio poético de Euclides, bem como uma característica tanto de sua vida pessoal quanto de sua concepção de arte. Em toda sua trajetória, seja no brilhantismo precoce, seja nas aventuras escolares e militares, seja na militância jornalística ou acadêmica, seja no casamento desastroso ou na obra literária – breve, mas descomunal – a impetuosidade apaixonada é notória. Guimarães Rosa, ele mesmo um escritor de potência demoníaca, admitiu em crítica: “Jamais ousaria medir forças com Euclides da Cunha. Ele é como um vento tempestuoso, que fustiga quem o encara!...” Só um poeta seria capaz de mensurar o poder de outro. A obra euclidiana, de fato, tem elementos suficientes para resistir a modas e gostos de qualquer tempo. Embora todos os seus trabalhos sejam de alto nível, “Os Sertões” é sua máxima realização. “O maior livro do Brasil”, declarou o crítico Samuel Putman, enquanto o poeta Robert Lowell, numa nota introdutória à tradução americana, fez questão de situá-lo entre “Guerra e Paz” de Tolstoi e “Moby Dick” de Melville. Particularmente, considero essa designação justíssima, porque assim como os respectivos gênios literários da Rússia e da América, Euclides da Cunha introduziu a literatura brasileira no átrio seleto e elevado dos titãs. Reparem que a grandiosidade do épico está em descrever, analisar, explorar e acumular os dados da atualidade e da introspecção. De todas as representações da experiência às quais a literatura almeja, de todas as reformulações da realidade propostas pela linguagem, as do épico (mais do que o romance) são as mais eloquentes e incisivas. As obras de Virgílio, Dante, Camões, Milton, Sthendal ou Thomas Mann documentam, em amplitude, a nossa percepção de mundo e do tempo. São como primas-irmãs da História. Neste sentido, “Os Sertões” é paradigmático. Seu texto divide-se em três partes: “A Terra”, “O Homem” e “A Luta”. Nas duas primeiras o autor faz um estudo geofísico e etnológico tão minucioso quanto permitiria a ciência da época, e tão poético quanto permitiria sua força estética. Tem falhas, naturalmente: ele tenta ver a realidade pelas lentes do positivismo e do idealismo alemão, mas a como a verdade se impõe a quaisquer “ismos”, Euclides muda radicalmente de tom e perspectiva. E no decorrer do texto todas as convicções científicas, filosóficas, republicanas vão desmoronando. Limpo dos preconceitos, ele procura demonstrar que a jagunçagem rebelde e fanática não é um conluio criminoso, mas o efeito-colateral de uma sociedade isolada que surge à revelia da ordem, no descaso do Estado, esquecida da civilização. Aí se destaca o timbre da honestidade intelectual, porque além da coragem de mudar de opinião em pleno texto, ele primou pela observação direta em confronto com testemunhos levianos. Basta mencionar, como exemplo, o cuidado que ele teve em desmentir um boato difundido na imprensa por Olavo Bilac, segundo o qual “o patife do Antônio Conselheiro havia sido o assassino da própria mãe e da esposa”. No capítulo IV, da segunda parte, Euclides revela que a mãe de Antônio Conselheiro havia morrido quando ele ainda era criança e que a esposa havia fugido com um policial para Salvador. Naquele tempo já existia imprensa marrom!... O tom épico se estende da primeira à última página, mas atinge o ápice na terceira parte, que descreve “A Luta”. Nela vemos uma mescla de Homero e Heródoto, ou seja, o cotejo da realidade com o mito. Não a toa, “Os Sertões” teve mais de cem edições em português, dezoito em espanhol, doze em inglês, nove em francês e cinco em alemão. Entre seus fãs confessos e ilustres estão Stefan Zweig, Hermann Hesse, Gabriel Garcia Márquez, José Saramago e os, continuadores, Mario Vargas Llosa e Sándor Márai. Este último descreveu magistralmente a dura realidade sertaneja (Veredicto em Canudos) sem nunca ter pisado no Brasil, enquanto o primeiro engordou a narrativa (A Guerra do Fim do Mundo) dando uma pitada de realismo mágico. Ah! Não se pode esquecer que Jorge Luis Borges, no conto “Três Versões de Judas” também fez referência à pessoa de Antônio Conselheiro. Nestas circunstâncias constatamos que, quando o público brasileiro não mais quiser, ou não souber apreciar o épico da “Tróia de taipa”, a memória de Euclides da Cunha já estará devidamente honrada.

Multimídia d'Os Sertões

A magnitude do evento histórico de Canudos foi de tal maneira capturado no texto de "Os Sertões", que muito de sua semântica impactante pode ser vislumbrada nos mais variados desdobramentos que suscitou. Com efeito, tem-se "Os Sertões" em fotografia:


"Os Sertões" em xilogravura":



"Os Sertões" no cinema:



"Os sertões" em quadrinhos:


E "Os Sertões" numa espetaculosa ópera-rock:


Sugiro que começe pelo texto.

Consciência Ecológica Euclidiana...


Não esqueçamos o agente geológico mais devastador – o homem.
Este, de fato, não raro reage brutalmente sobre a terra e entre nós nomeadamente, assumiu, em todo o decorrer da história, o papel de um terrível fazedor de desertos. Começou isto por desastroso legado indígena.
Na agricultura primitiva dos silvícolas era instrumento fundamental – o fogo.
Entalhadas as árvores pelos cortantes dgis de diorito; encoivarado, depois de secos, os ramos,alastravam-lhes por cima, crepitando, as caiçaras, em bulcão de fumo, tangidas pelo vento. Inscreviam, depois, nas cercas de troncos combustos das caiçaras, a área em cinzas onde fora a mata exuberante. Cultivaram-na. Renovavam o mesmo processo na estação seguinte, até que, de todo exaurida aquela mancha de terra, fosse, imprestável, caapueira – mato extinto – como o denuncia a etimologia tupi, jazendo dali por diante irremediavelmente estéril...
Veio depois o colonizador e copiou o mesmo proceder.
Imaginem-se os resultados de semelhante processo aplicado, sem variantes, no decorrer dos séculos...
Previu-os o próprio governo colonial. Desde 1703 sucessivos decretos visaram opor-lhes paradeiro. E ao terminar a seca lendária de 1791-1792, a grande seca, como dizem os mais velhos sertanejos, que sacrificou o Norte, da Bahia ao Ceará, o governo da metrópole figura-se tê-la atribuído aos inconvenientes apontados desde logo, como corretivo único, severa proibição ao corte de florestas.
Esta preocupação dominou-o por muito tempo. Mostram-no-lo as cartas régias de 17 de março de 1796, nomeando um “Juiz Conservador de Matas”; e a de 11 de setembro de 1799, decretando que “se coíba a indiscreta e desordenada ambição dos habitantes da Bahia e Pernambuco que têm assolado a ferro e fogo preciosas matas... que tanto abundavam e já hojeficam a distâncias consideráveis, etc”.


Trecho do Capítulo V, da primeira parte
de “Os Sertões”.

sábado, 4 de julho de 2009


Um blog sobre incertezas, literatura & tombos na rua....

Declínio e Queda


, a pessoa que, há meses, está preparando uma certa pesquisa biográfica, o resgate histórico de um ilustre desconhecido, viaja algumas léguas até uma cidade específica, no maior empenho do mundo, para recolher documentos deveras importantes, num determinado convento, auxiliado por um frei todo paciência, solicitude e generosidade, ao lado do qual passa quase o dia inteiro vagando entre a biblioteca e o cemitério, do dito lugar, revirando fotos antigas, cartas encardidas e tals. Aí, a pessoa, já assaz satisfeita, suada, suja e, sobremaneira, bem informada sobre o referido e incógnito biografado, decide então que é hora de voltar. Aí, a pessoa agradece, despede-se e sai. Aí, a pessoa, com o lepitopi cheio de coisas e a cabeça cheia de ideias, de repente, olha em volta e percebe que está perdida. Aí, a pessoa perambula pelo bairro, erra as calçadas, pisa num côco -veja bem - num côco, e cai... Catapuf!... Aí, todo mundo ri e quase ninguem acode. Aí, a pessoa, muita digna, toda séria, se levanta, ajeita a roupa e a alma, e vai por ali, pela estrada a fora, pensando em quantos outros grandes historiadores já não cairam em circunstâncias análogas. Aí a pessoa, já confortada pela imagem de Heródoto se estatelando numa rua persa, ou do distraído Tucídides lascando a cara num obelisco egípicio, entra numa farmácia da rodoviária, compra um bandeidi, faz os devidos reparos, e toma o rumo de casa. Aí, a pessoa, já ônibus, recosta-se cadeira e, ainda como Heródoto, pensa: de todos os infortúnios que que afligem o homem, o mais amargo é que temos a consciência de muito, mas o controle de nada.

domingo, 21 de junho de 2009

E aí eu acordo, e... tá 17 GRAU!!!


"O Inverno é um vovozinho trêmulo, com a boina enterrada até os olhos, a manta enrolada nos queixos e sempre resmungando: "Eu não passo deste agosto, eu não passo deste agosto..."


Mário Quintana,

in Lili Inventa o Mundo.

quarta-feira, 10 de junho de 2009

Presença Real

Celebra-se hoje o mistério da presença. Aquele que tudo criou e tudo dispõe, pode ser contemplado numa diminuta partícula, fina e circular, que chega aos nossos sentidos, tão limitados em sua imanência, como um suplemento para a transcendência abosulta. A lógica deste mistério, só inteligível aos que creem, e também aos que leem, tem implicações não apenas metafísicas, mas também semânticas: Transubstanciar é traduzir!
A princípio, Deus estava inacessível à linguagem humana, à articulação conceitual ou a qualquer tipo de pensamento verbalizado. Sua presença era a presença rigorosamente inconcebível, inimaginável e impronunciável do Sinai: Não pronunciareis o meu nome!... Sua revelação era espinhosa como uma sarça, e ardente como uma tautologia: Eu sou Aquele que é!... Qualquer tentativa para caracterizá-lo, para representá-lo, para figurá-lo ou significá-lo, ainda que de forma análoga, era terminantemente proibida: Não farás para ti imagem!...
Mas quando chegou a plenitude dos tempos, o Verbo indizível de Deus se fez carne e veio habitar entre nós. Noutros termos, Ele próprio fez-se imagem, adquiriu figura humana, confirmando assim uma forma já prefigurada no Gênesis: Façamos o homem a nossa imagem, como nosso semelhante!.. Dessa vez Ele mesmo se fez homem, e então ficamos conhecendo não somente o seu nome, mas também a sua face. A misteriosa tautologia da sarça transubstanciou-se na luminosa ontologia do presépio. E a luz brilhou nas trevas!...
Sua presença era real, visível, pronunciável, sensível e até degustável. Sim, porque a grande teofania só estaria completa depois de outra transubstanciação. O verbo que virou carne, agora seria pão, pois assim dizia o 16° capítulo do Êxodo: Deu-lhes o pão do céu a comer!... Com efeito, o Verbo que veio habitar entre nós assim declarou: O pão do céu é aquele que desce do céu e dá vida ao mundo!... Eu sou o pão da vida que desceu do céu!...
A encarnação do Verbo e a sua transubstanciação em pão constituem o grande mistério da Presença Real na eucaristia, que traduz a transdência absoluta do Criador para a imanência contingente da criatura. E, de forma absolutamente singular, essa concepção, como notou Pascal, foi o que impeliu o espírito humano a observar sua profundidade ontológica sob uma perspectiva iminentemente semântica.
Quando Shakespeare, por exemplo, descobre a imagem da "incorporação" (Na peça "Sonho de uma Noite de Verão") para descrever a presença genérica do conteúdo na forma e do sentido no ato, sua poesia estabelece uma analogia direta com a "presença real" da transubstanciação eucarística. Como nenhum outro acontecimento em nossa história espiritual, o postulado da kenosis de Deus por intermédio de Cristo e de sua ininterrupta presença na hóstia e no vinho sacramentais, condiciona, num nível bastante profundo, toda concepção estética.
Antes de Pascal e Shakespeare, São Tomás de Aquino já havia notado que graças à transubstanciação do supremo mistério da presença divina e de sua concreção numa forma exterior (a da eucaristia), o homem podia e devia imprimir um significado ao sensorial. Pois Deus, ao se revelar e participar de nossa condição física, concedeu-nos a dignidade de participarmos e revelarmos sua divindade. Com efeito, já não há interdição ao símbolo, e obsoletos são os anátemas do "Êxodo" e da "República" de Platão.
O ingenium do artista que concebe formas, o processo de imprimir significação à matéria bruta e o poder das artes e da literatura para produzirem imagens, transformam de fato a ficção numa figura veritatis, uma figuração da verdade. É essa semiótica do signo, essa materialidade do imaterial, consentida na encarnação do verbo e confirmada na transubstanciação da hóstia e do vinho, que reforça as singularidades da experiência estética com suas funções de verdade ficcional.
Toda criação verdadeiramente artística ou literária abriga uma "presença real". Como o Cristo na eucaristia, a persona engendrada por um escritor (ou pintor, ou escultor, ou compositor) pode ser perene e onipresente. Nenhuma temporalidade diminui as urgentes indecisões de Hamlet, o heroísmo patético de Dom Quixote ou o cinismo de Brás Cubas. O coelho de Alice no País das Maravilhas continua a correr atravessando os séculos. O autor às vezes é esquecido, mas a sua personagem pode sobreviver muito além da localidade e da língua em que foi criada, pois traduzir é transubstanciar. O grego de Homero e o aramaico dos evangelhistas já não é falado hoje, porém Aquíles e os convidados da Última Ceia continuam revigorando cada vez mais sua presença inextinguível.
Habitamos mundos de linguagem (como queria Heidegger) ou jogos de linguagem (como queria Wittgenstein) de um modo tão multifacetado e íntimo que nossa própria sensação de ser é, fundamentalmente, estética. É algo que se torna "sensível", nas condições mais abrangentes deste termo, por meio de uma transubstanciação. Ouvir uma música, admirar um quadro ou ler um livro é o mesmo que comungar: participamos de uma transcendência em tom menor. Não à toa, Oscar Wilde, depois de convertido, dizia que quando lemos realmente, quando a experiência é a descoberta do significado, agimos como se o texto (a peça de teatro ou uma escultura) encarnasse a presença real de um ente significante. Ser habitado pela música, pela arte, pela literatura, tornar-se capaz de reagir a tais hospedagens como anfitrião - ainda que inesperado - é ter a simples experiência eucarística.
Cada frase, verso, parágrafo, página, livro, pintura ou canção tem o efeito comunicador das partículas sacramentais, podendo expandir seu significado no tempo e no espaço a todos aqueles que seu autor não viu nem conheceu, simplesmente por não terem ainda nascido.
O agente épico, cêncio ou ficcional possuem uma vitalidade, uma densidade, isto é, uma presença tão real que supera, com frequência, a de qualquer ser vivo.
Portanto, só a articulação dos três campos semânticos em torno da sagrada eucaristia - o teológico, o filosófico e o poético - pode assumir a sua mais orgânica coesão. E fique dito, mas bem dito, que colocar isso em texto não representa nenhuma tentativa de proselitismo religioso ou de exercício filológico, por mais legítimos e férteis que sejam. Representa apenas uma oportunidade para medir com a maior precisão possível nossa distância de um centro perdido e a extensão das sombras projetadas por nosso atual crepúsculo laico - embora certamente tais sombras anunciem um dia novo, anunciem aquilo que Dante teria batizado de uma "Vita Nuova".

Palavras Cantadas

Adoro te devote, latens Deitas,

Quæ sub his figuris vere latitas;

Tibi se cor meum totum subjicit,

Quia te contemplans totum deficit.

Adoro-Te com amor, Divindade latente

Sob estas espécies deveras presente

Todo o meu coração está sujeito

Em tua contemplação desfeito

São Tomás de Aquino
Século XIII

domingo, 7 de junho de 2009

Miss Solidão


A solidão é a região mais agreste da poesia, e nenhum outro poeta, nem mesmo Emily Brönte, parece-nos tão desolada quanto a sua quase homônima, Emily Dickinson. A grande estrela da poesia americana depois de Walt Whitman, e uma das mais brilhantes da língua inglesa, temia a solidão como quem teme a cegueira, e teve com ambas encontros psicossomáticos.
Emily Dickinson era rica (como a maioria dos calvinistas tradicionais), casada com um juiz, mas apaixonada pela irmã deste - a quem dedicou alguns dos seus melhores poemas, como "Não posso viver com você" e "Renúncia é virtude cortante". Estes títulos já nos dão uma clara idéia do quanto se pode ser solitário mesmo estando acompanhado.
Contudo, a arte de Dickinson não se restringe a isso; na verdade o seu gênio é tão original, que chega a modificar o nosso entendimento quanto às possibilidades da poesia. Se é possivel a algum poeta reinventar o seu estilo a cada novo poema, é algo discutível. Mas se alguém foi capaz de fazê-lo, esse alguém foi Emily Dickinson. Pelo menos é a impressão que eu tenho.
Também é impossível lê-la sem ser confrontado por sua espiritualidade sumamente individualizada. Quem a lê percebe uma experiência cristã pouco convencional, que ela declinava de expressar aberta e conscientemente, limitando-se a dramatizá-la na poesia. No poema "Imperatriz do Calvário", por exemplo, Dickinson insinua haver sido desposada pelo Espírito Santo, uma alegoria mística tipicamente católica, que ela vai descobrir no quinto versículo do capítulo 62 de Isaías.
Diante de tais aspectos, depreende-se logo que convém conhecer nossos limites ao lermos a obra dessa mulher formidável, e ao tentarmos decifrar sua alma complexa e solitária. Eu não me atrevo a dizer muito, pois dos seus 1.789 poemas li apenas algumas dezenas. Não obstante, nestes poucos, deu para ouvir uma angustiada canção de vitória sobre desejos sublimados. Vale experimentar.
O esplendor de sua poesia resiste às traduções, mas se souber inglês leia no original, pois, apesar do esforço, seus tradutores sempre deixam escapar algo. Talvez isso seja consequência do uso excessivo de travessões que refletem um certo laconismo, sempre mais enigmático à medida que as palavras se justapõem.
Mas que ninguém hesite ou faça careta, é indubitável sua força poética. Quanto mais a lemos, mais ela nos expõe às suas epifinias verbais.


À noite, como deve se sentir solitário o vento

Quando todos apagam a luz

E cada um em seu aconchego

Fecha a janela e vai dormir


Pela manhã, como deve se sentir poderoso o vento

Ao se deter em mil auroras

Desposando cada uma, rejeitando todas

E recolhendo-se ao seu esguio templo, depois.



Emily Dickinson

sábado, 6 de junho de 2009


Um blog sobre literatura, línguas estranhas e a ligeira absurdidade do mundo real!!!

Depois de quase um ano fora de órbita, eis que...

Volvo, num razantem, a q'esto admirabille mundo nuewo, e constactu qui gà näun recognesco mi loqui, qui gà não ç'ei iscreber a grammàthica che, per circa de trynta anños, luttei para domminar. He comu ssi nüm p'zzadelo "joyceano", una stranhga çïndrome de "Finnegans Wake" ouveçe akomettidu os lequissógraphos... Synistrus, assaz synistrus!!!
Pero, rogu qui me perdonneis pelus danos qui l venga á faser á grammàthica, por'ke istou phalando num loqui que gà näum eh u meo, y qui, comu o perssebereis in puecos instant's, quizá näum c'eja tampueco o vostru.”