Ninguém dava nada por ele. Era o objeto de preocupação e lástima da família. Asmático, sempre doentinho, queridinho da mamãe que o chamava de mon petit jaunet (meu amarelinho), mon petit benêt (meu palerminha) ou mon petit nigaud (meu idiotinha), ele contrariou todas as expectativas e logrou tornar-se num dos grandes reinventores do romance moderno, e um dos mais emblemáticos escritores do século XX. Estou falando de Marcel Proust, o antípoda e arquirival de James Joyce. Como Joyce, ele também inventou técnicas de narrar de maneira minuciosa, fascinante e, às vezes, irritante. Só que ao invés da corrente "não-lógica" de Joyce, ele criou aquilo que chamam de "phrase à tiroirs" (algo como: frase com gavetas!), um truque sintático onde uma oração após a outra é obrigada a inserir-se na precedente, criando um longo e sinuoso período que parace contido numa mesma unidade semântica!... É uma coisa difícil de ler, e às vezes de entender, mas indispensável às epifinias ou à impressão de "busca" que sua narrativa propõe.
Ainda assim ninguém esperava que fosse um gênio, tinha fama de excêntrico e frívolo – André Gide por exemplo, recusou-se a publicar seus primeiros textos, considerando-os como histórias fúteis de duquesas e coquetes (mais tarde lamentou o fato como o maior remorso de sua carreira). O mais irônico de tudo isso é que a vida mundana e as boas relações de Proust tiveram grande influência sobre sua obra, já que era sua principal matéria funcional - e essa reputação de frivolidade era o inverso de uma alta exigência artística. Ainda jovem, ele decidiu que faria a maior obra literária de sua língua, algo mais grandioso do que a descomunal Comédia Humana de Balzac!... E foi então que lhe ocorreu a idéia de escrever um livro que fosse uma ponte entre o tempo e a memória, e que ao mesmo tempo fosse suntuoso como uma cateral!... Isso consumiria vinte anos de sua curta vida, mas o resultado seria “Em Busca do Tempo Perdido”, um relato de mais de quatro mil páginas, que se estende por sete magníficos volumes, dando corpo ao romance que dividiria a narrativa ocidental em antes e depois de Proust, e que hoje quase ninguém lê.
A busca pelo tempo que se perdeu era uma dura tentativa de reunificar o próprio eu - um eu que foi esfacelado pelo ciúme que, aliás, é a matéria-prima deste romance. Proust era um homem mal-amado e, portanto, fecundo ao tratar do ciúme; ninguém jamais se dedicou de modo tão minucioso e brilhante a ilustrar essa emoção; exceto Shakespeare, em "Otelo", Hawthorne, em "A Letra Escarlate" e Machado de Assis, em “Dom Casmurro”. Os personagens de Proust juntos compõem o arquétipo do amante ciumento, ou seja, de si mesmo, procurando no tempo perdido não uma pessoa, mas a epifania do sujeito enclausurado pelo desejo, e artífice do seu próprio inferno. Em Proust o ciúme se renova como a lua, perpetuamente tentando descobrir o que nem lhe interessa mais, até mesmo depois do objeto do desejo estar literalmente enterrado. Seu verdadeiro objeto é "aquele dia, aquela hora no passado irrevogável"; e mesmo esse tempo é menos real do que uma ficção, um episódio na história de evanescência da sua própria identidade.
Ainda assim ninguém esperava que fosse um gênio, tinha fama de excêntrico e frívolo – André Gide por exemplo, recusou-se a publicar seus primeiros textos, considerando-os como histórias fúteis de duquesas e coquetes (mais tarde lamentou o fato como o maior remorso de sua carreira). O mais irônico de tudo isso é que a vida mundana e as boas relações de Proust tiveram grande influência sobre sua obra, já que era sua principal matéria funcional - e essa reputação de frivolidade era o inverso de uma alta exigência artística. Ainda jovem, ele decidiu que faria a maior obra literária de sua língua, algo mais grandioso do que a descomunal Comédia Humana de Balzac!... E foi então que lhe ocorreu a idéia de escrever um livro que fosse uma ponte entre o tempo e a memória, e que ao mesmo tempo fosse suntuoso como uma cateral!... Isso consumiria vinte anos de sua curta vida, mas o resultado seria “Em Busca do Tempo Perdido”, um relato de mais de quatro mil páginas, que se estende por sete magníficos volumes, dando corpo ao romance que dividiria a narrativa ocidental em antes e depois de Proust, e que hoje quase ninguém lê.
A busca pelo tempo que se perdeu era uma dura tentativa de reunificar o próprio eu - um eu que foi esfacelado pelo ciúme que, aliás, é a matéria-prima deste romance. Proust era um homem mal-amado e, portanto, fecundo ao tratar do ciúme; ninguém jamais se dedicou de modo tão minucioso e brilhante a ilustrar essa emoção; exceto Shakespeare, em "Otelo", Hawthorne, em "A Letra Escarlate" e Machado de Assis, em “Dom Casmurro”. Os personagens de Proust juntos compõem o arquétipo do amante ciumento, ou seja, de si mesmo, procurando no tempo perdido não uma pessoa, mas a epifania do sujeito enclausurado pelo desejo, e artífice do seu próprio inferno. Em Proust o ciúme se renova como a lua, perpetuamente tentando descobrir o que nem lhe interessa mais, até mesmo depois do objeto do desejo estar literalmente enterrado. Seu verdadeiro objeto é "aquele dia, aquela hora no passado irrevogável"; e mesmo esse tempo é menos real do que uma ficção, um episódio na história de evanescência da sua própria identidade.
Por isso, "Em Busca do Tempo Perdido" é um livro que dá pena acabar. E Proust é um desses gênios que, uma vez lidos, nunca nos abandonam. Tomamo-nos de interesse pelas minúcias de sua vida pessoal, já que minuciosa e personalíssima é sua obra.
3 comentários:
E ALEM de tudo isto que escrevestes ele era filho de mae JUDIA.
BRILHANTE TEU TEXTO e me inspirou a ler EM BUSCA DO TEMPO PERDIDO.
obrigada.
E Joyce era neto de judeus!...
que maravilha que eh este mundo literario, os grandes escritores todos saido do mundo judaico.
grazas a voce estou devorando PROUST, muito mais pelo maravilhoso estilo que ele escreveu do que pelas historias em si.
ele me parece um chato burgues de galocha, mas
um grande maravilhoso escritor!
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