Essa certamente não é a palavra que melhor define o primeiro grande romancista brasileiro, mas é a que sempre me vem à cabeça quando ouço o nome dele. O cearense José de Alencar - cuja data de nascimento coincide com o dia do trabalhador, ou seja, 1º de maio - foi o escritor que mais trabalhou para dar a nossa literatura um sotaque próprio, nativo, seu. E conseguiu, embora tenha pago caro. É com ele que surge a literatura brasileira propriamente dita, povoada por índios, sertanejos, capoeiras, gaúchos, e claro, a gente das cidades. E é a partir dele que tem início a linhagem dos grandes escritores telúricos do Brasil, isto é, aqueles que vinculam bem de perto suas narrativas à terra, ao espaço, à paisagem - como Euclides da Cunha, Rachel de Queiroz (sua parenta distante), Graciliano Ramos, Mário de Andrade e João Guimarães Rosa.
E não é exagero chama-lo de exagerado, pois nele, de fato, tudo é exagero. Coisa que nem sempre é um defeito. Franz Kafka já afirmara: “quem exagera, super-vê”. Na lógica de Kafka e Alencar, a literatura é como um microscópio psicológico (quando se debruça sobre a personalidade de um personagem), ou ainda como um telescópio social (quando procura mostrar um panorama do seu tempo). Muita gente faz piada dos escritores românticos, pelo excesso de tinta que usavam. Mas foi justamente dessa tinta que surgiu o realismo mágico de nossa época. Quem não se lembra da cena final de O Guarani: o índio Peri e a jovem Ceci fogem da inundação do rio Paquequer, subindo ao topo de uma palmeira. No entanto, a água os alcança, (o que já sugere um dilúvio universal). Peri apóia-se nos cipós de outras árvores (o que não faz muito sentido, porque eles haviam subido na árvore mais alta) para, com força de Hércules e mesmo contra leis elementares da Física, contra a pressão inversa da massa de água, arrancar, com seus braços, a palmeira cravada na terra que ele usa como um barco salvar a sua amada Ceci da enchente. Mais Gabriel Garcia Márquez impossível! À falta de Clark Kent, Peri talvez seja nosso maior super-herói – é uma pena que não tenhamos um Steven Spielberg (bem como os seus recursos técnicos e financeiros) para transformar O Guarani, de José de Alencar, em um grandioso filme de aventuras, cheio de efeitos especiais (O Guarani já foi filmado, desde 1916, algumas vezes, mas nem de longe com o mesmo sucesso da versão original em livro). A alusão ao cinema não é gratuita. Alencar filmava com as palavras, construindo sucessivos zooms e panorâmicos travellings. Por isso, lê-lo no século XXI, pode ser um “prazer inenarrável”, como diriam os românticos exagerados, porque mais do que qualquer outro romancista brasileiro ele nos oferece uma fantástica viagem no tempo. Machado de Assis, por exemplo, é e sempre será atual, enquanto Alencar, com seu texto datado, mostra que somos parte de uma história de longa duração, que somos parte de uma cultura bem mais antiga do que nós ou nossos avós, que somos parte, no final das contas, da espécie humana. Dessa mesma espécie que não sabe quem é, de onde veio, para onde vai, ou que raios está fazendo aqui – por isso, inventa as respostas, criando personagens inverossímeis e enredos fabulosos. Pois como ele mesmo dizia, não há nada mais inverossímil do que a própria verdade.
E não é exagero chama-lo de exagerado, pois nele, de fato, tudo é exagero. Coisa que nem sempre é um defeito. Franz Kafka já afirmara: “quem exagera, super-vê”. Na lógica de Kafka e Alencar, a literatura é como um microscópio psicológico (quando se debruça sobre a personalidade de um personagem), ou ainda como um telescópio social (quando procura mostrar um panorama do seu tempo). Muita gente faz piada dos escritores românticos, pelo excesso de tinta que usavam. Mas foi justamente dessa tinta que surgiu o realismo mágico de nossa época. Quem não se lembra da cena final de O Guarani: o índio Peri e a jovem Ceci fogem da inundação do rio Paquequer, subindo ao topo de uma palmeira. No entanto, a água os alcança, (o que já sugere um dilúvio universal). Peri apóia-se nos cipós de outras árvores (o que não faz muito sentido, porque eles haviam subido na árvore mais alta) para, com força de Hércules e mesmo contra leis elementares da Física, contra a pressão inversa da massa de água, arrancar, com seus braços, a palmeira cravada na terra que ele usa como um barco salvar a sua amada Ceci da enchente. Mais Gabriel Garcia Márquez impossível! À falta de Clark Kent, Peri talvez seja nosso maior super-herói – é uma pena que não tenhamos um Steven Spielberg (bem como os seus recursos técnicos e financeiros) para transformar O Guarani, de José de Alencar, em um grandioso filme de aventuras, cheio de efeitos especiais (O Guarani já foi filmado, desde 1916, algumas vezes, mas nem de longe com o mesmo sucesso da versão original em livro). A alusão ao cinema não é gratuita. Alencar filmava com as palavras, construindo sucessivos zooms e panorâmicos travellings. Por isso, lê-lo no século XXI, pode ser um “prazer inenarrável”, como diriam os românticos exagerados, porque mais do que qualquer outro romancista brasileiro ele nos oferece uma fantástica viagem no tempo. Machado de Assis, por exemplo, é e sempre será atual, enquanto Alencar, com seu texto datado, mostra que somos parte de uma história de longa duração, que somos parte de uma cultura bem mais antiga do que nós ou nossos avós, que somos parte, no final das contas, da espécie humana. Dessa mesma espécie que não sabe quem é, de onde veio, para onde vai, ou que raios está fazendo aqui – por isso, inventa as respostas, criando personagens inverossímeis e enredos fabulosos. Pois como ele mesmo dizia, não há nada mais inverossímil do que a própria verdade.
Um comentário:
Eu gosto do José de Alencar, muita gente fala mal dele; deve ser preguiça de ler, ou de entender.
Eu não li O Guarani, mas fiquei curiosa.
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