sábado, 12 de dezembro de 2009

A noite escura da alma




Que bem sei eu a fonte que mana e corre,
mesmo sendo noite!

Aquela eterna fonte está escondida,
que bem sei eu aonde tem guarida,
mesmo de noite!

E pela noite escura desta vida,
que bem sei eu por fé a fonte frida,
mesmo de noite!

Sua origem não sei, pois não a tem;
mas sei que toda origem dela vem,
mesmo de noite.

Sei que não pode haver coisa tão bela,
e sei que céus e terra bebem dela,
mesmo de noite.

Bem sei que solo nela não se vê
e ninguém pode atravessá-la a pé,
mesmo de noite.

Tem claridade nunca escurecida,
e sei que toda luz é dela havida,
mesmo de noite.

Sei serem tais caudais suas correntes
que céus e infernos regam, como às gentes,
mesmo de noite.

A caudal que provém desta nascente
bem sei ser mui capaz e onipotente,
mesmo de noite.

A corrente que de uma e outra procede
sei que nenhuma delas a precede,
mesmo de noite.

Bem sei que três numa única água viva
residem, e que de uma a outra deriva,
mesmo de noite.

Aquesta eterna fonte está escondida
em nosso vivo pão, por dar-nos vida,
mesmo de noite.

Aqui estão chamando as criaturas,
e fartam-se desta água, ainda às escuras,
porque é de noite.

Aquesta esta viva fonte, que desejo,
eu neste pão de vida bem a vejo,
mesmo de noite.




San Juan de la Cruz

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